1. Considerando entendimento firmado pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, nos autos do Mandado de Segurança 1.0000.14.013350-5/005, tendo sido proferido acórdão interpretando o artigo 38 da Lei 9.514/97 e o artigo 852 do Código de Normas (Provimento 260/CGJ/2013), tanto em sua redação primitiva, quanto em sua redação dada pelo Provimento 299/CGJ/2015.
2. No voto do relator do citado Mandado de Segurança, transcreveu-se esclarecimentos do Corregedor-Geral de Justiça, com o seguinte teor:
“Nota-se que o ponto nodal da impugnação feita pelo impetrante reside justamente no entendimento por ele firmado no sentido de que a Lei 9.514/97, que rege o Sistema de Financiamento Imobiliário, autoriza a contratação de alienação fiduciária tanto na forma de escritura pública como por instrumento particular, conforme disciplinado no artigo 38 abaixo transcrito:
Art. 38 – Os atos e contratos referidos nesta Lei ou resultantes da sua aplicação, mesmo aqueles que visem à constituição, transferência ou modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis, poderão ser celebrados por escritura pública ou por instrumento particular com efeitos de escritura pública.
Contudo, é técnica de hermenêutica que para se analisar o artigo de uma norma, este tem que, obrigatoriamente, ser examinado dentro do contexto em que foi editada, pois se analisado de forma isolada poderá ensejar interpretações equivocadas, como a do caso vertente.
O cerne da questão consiste em observar que o art. 38 da Lei 9.514/97 se refere exclusivamente aos contratos celebrados sob as regras do Sistema Financeiro Imobiliário, em decorrência da expressão ‘referidos nesta Lei ou resultantes de sua aplicação’.
Desse modo e levando-se em consideração que a Lei Federal nº 9.514/97 é específica porquanto disciplina regras que serão observadas por pessoas autorizadas a operar pelo Sistema de Financiamento Imobiliário, somente estas detém a prerrogativa de formalizar seus contratos e demais negócios por instrumento particular.
Ao transcrever a regra para o Código de Serviços Notariais e de Registro do Estado de Minas Gerais, teve-se o cuidado de adaptar a redação do dispositivo para manter a contextualização da norma. Ou seja, a redação do parágrafo 2º, do artigo 867 do Provimento 260/2013 nada mais fez do que adaptar o texto do dispositivo para que, mesmo retirado do contexto da Lei Federal, fosse mantido o mesmo entendimento. (Grifei)
Isso porque, caso fosse extirpada a informação de que somente as instituições credenciadas pelo SFI pudessem alienar imóvel por instrumento particular, todas as instituições assim o fariam.
Ocorre que o Código Civil prevê como regra geral que a alienação de imóveis depende de Escritura Pública, consoante dispositivo abaixo transcrito:
Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
A celebração do negócio jurídico por instrumento particular é exceção e somente ocorre nos casos previstos em Lei.
E nesse ínterim, ressalta-se que o artigo 4º da Lei Federal 9.514/97 prevê que as operações de financiamento imobiliário serão efetivadas pelas entidades autorizadas a operar pelo SFI, o que permite concluir que as demais, como a empresa que vendeu os imóveis para o impetrante, não integram o SFI, ficam vinculadas à regra geral preconizada no art. 108 do Código Civil.”
3. Deste modo, concluiu-se que a interpretação a ser dada ao artigo 38 da Lei 9.514/97 é no sentido de que apenas as empresas que integram o SFI – Sistema Financeiro Imobiliário podem se valer de contratos particulares para a prática de atos e contratos relativos a alienação fiduciária de bens imóveis e negócios conexos, com valores superiores a trinta salários mínimos.